Frequentemente
observo que o ser humano apresenta um enorme fascínio pelo exato, pelo novo.
Nesse sentido, não é difícil observar como nossa civilização desenvolveu
historicamente uma grande capacidade de exaltar o belo, cíclico e o perfeito em
detrimento do desarmônico e assimétrico. Platão, na idade antiga, já afirmava
que aquilo que é belo tende ao mesmo tempo a ser justo e bom. Em grande parte, mantemos esse mesmo
raciocínio hoje em dia quando deixamos para comemorar apenas datas redondas (
10, 25 ou 100 anos de algo ) e sobretudo o início de um novo ciclo; como o
início de um novo ano. Considero que, ao agirmos assim, muitas vezes nos
equivocamos ao darmos mais valor ao resultado do que ao processo em si. Como se
de alguma forma, o último dos dias que compõem um ano fosse mais importante que
os demais 364 dias vividos.
Acredito
que todo esse fascínio tenha surgido através da necessidade que o ser humano
apresenta de encontrar padrões e regularidades em sua vida. Talvez, em razão disso, tenhamos tanta
simpatia em deixarmos um projeto para começar na segunda ou esperamos uma hora
redonda para iniciar nossos estudos. De fato, a regularidade e a busca de
certos padrões de tempo podem simplificar e facilitar nossa vida. Afinal, não é
exatamente o que fazemos quando planejamos e organizamos nossas atividades? Entretanto, parece-me que o grande problema
de vivermos uma vida tão metodicamente traçada e definida por padrões e ciclos,
é justamente a possiblidade de perdermos o senso de continuidade.
Muitas
vezes, tendemos a sobrevalorizar o último passo de um enorme desafio por
preciosismo ou simplesmente pela necessidade de definir um símbolo da
conquista. Da mesma forma como um atleta tende a pensar que uma medalha de ouro
em um campeonato é a expressão máxima de seu esforço. Não, não é, e para mim
nunca será. O Fato é que pouco a pouco perdemos a noção de que a realidade se
faz presente em cada segundo que vivemos, não há fórmulas ou palavras mágicas
para nada, muito menos para o sucesso. A continuidade do esforço e da dedicação
ao longo do processo são as verdadeiras marcas de uma caminhada exitosa.
Noto
que a percepção do ser humano contemporâneo sofreu uma considerável alteração
com o desenvolvimento da modernidade. Deste modo, acredito que o conceito de
tempo e o senso de continuidade foram gradualmente reduzidos a fragmentos
dispersos, sobretudo em uma sociedade que preza cada vez mais pela instantaneidade
. Bom mesmo seria se pudéssemos dar valor aos infinitos detalhes que compõem um
momento, pois aí residem a harmonia e a verdadeira beleza das lembranças que
ficam.