A chuva intensa quebrava sobre o para-brisa do
carro que meu pai me emprestara. Minha aula de alemão havia acabado e eu me
encontrava pronto para voltar para minha casa. Sentado ali, dentro do carro e
observando a velocidade e a desenvoltura com que as gotas de chuva caiam no
vidro e subitamente se espalhavam, formando aquele velho chiado inconfundível
de chuva irrompendo contra uma superfície, e envolto pelo conhecido cheiro de
terra molhada, o qual insistia em adentrar no carro, eu olhava para frente, mas
não via nada além de lembranças. Era 17 de outubro de 2011 e naquele mesmo dia
um grande amigo meu havia falecido.
Impressionante como algo que para nós é usual e recorrente pode tão de súbito ser eternamente aprisionado no passado. Tal qual o tempo repentinamente nos roubasse algo para nunca mais devolver. A morte, embora eu não veja como único exemplo, assume com toda certeza o fator mais ilustrativo. E diante desta teimosa delinquência do tempo, que insiste em continuar nos privando daquilo que temos ou gostamos, não nos resta outra coisa senão recorrermos à nostalgia e às lembranças.
Recostar no banco do carro, ligar o automóvel, tentar vislumbrar o
horizonte verde a minha frente por meio do vidro molhado e assim, exatamente
assim mesmo, pensar na vida, pensar em mim mesmo pensando na vida e no modo
como eu, ali, me encontrava. Infelizmente, tudo isso não mudaria nada do que
aconteceu, mas com toda a certeza marcaria este momento em minha memória de um
modo único e especial. Do modo como eu escrevo agora. Não me restava outra
coisa senão finalmente dar a partida no carro e me conduzir de volta para casa.
Quem sabe, assim como o carro, que nos ajuda a sair de um local e chegar em
outro, também meus sentimentos pudessem migrar do saudosismo melancólico para
algo melhor.
Pronto. Tinha que sair dali. Antes porém, decido ligar o rádio.
Afinal de contas, nada melhor do que a música para nos fazer despertar um
específico estado de espírito.
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