domingo, 1 de dezembro de 2013

Ponto de equilíbrio

“De repente, não sou nem metade do homem que eu costumava ser, há uma sombra que paira sobre mim. Ah, o ontem veio subitamente”. ( Yesterday/ Paul McCartney ) Gostaria de poder dispor de palavras tão assertivas quanto às desta breve canção escrita há mais de meio século. De fato, cada vez mais me impressiono como, diante da enorme complexidade humana, muitas vezes recorremos a padrões tão parecidos de comportamento. Como se a angústia e o sofrimento fossem um código universalmente compreendido, como se dispuséssemos apenas dos mesmos mecanismos para soluciona-los. Acredito que no final das contas essa homogeneização ocorre porque vivemos em sociedade. Afinal, em nosso tempo, de que outro modo seria possível conduzir nossas vidas senão através da superação de desafios ?  
Na música Yesterday, o eu lírico se lamenta pela perda da pessoa amada e pelo sentimento de culpa diante da falta de informações.  Nesse sentido, não lhe resta outro conforto senão a contemplação da saudade e a espera de que o ontem possa ser novamente vivido. A mim, esta interpretação e a música em seu todo são um convite constante à nostalgia: esta vontade de querer reviver o que já não se pode mais, de  abandonarmos nossas expectativas sobre o futuro e lançarmos, ao invés, projeções apenas sobre nosso passado. Algo que, diante de determinados contextos, parece ser muito mais confortável que enfrentar o problema em si.
Saudade, uma palavra tão peculiar à nossa língua materna, mas ao mesmo tempo tão universal. Diante da efemeridade da vida e da singularidade do momento, acredito que pouco a pouco nos condicionamos a esperar também por esse ontem idealizado. Esse segundo especial capaz de invadir nossas vidas, como uma ser que nos surpreende adentrando em nosso caminho, e nos restaurar, mesmo que por um breve instante, aquele velho brilho apagado. Sim, eu Concordo: acreditar no ontem é preciso, afinal, não é de lá que viemos ?  não é deste constante suceder de momentos que somos produzidos ?  Apreciar o passado é tão importante quanto saber projetar o futuro. O presente, considero ser a arte de saber conciliar esta dualidade. 
A partir do momento que o homem deixa de projetar expectativas ele inconscientemente abdica de viver. Do mesmo modo, renegar o passado significa constantemente renegar a própria história e a aprendizagem dela derivada. Assim como qualquer arte, na vida também é indispensável que haja equilíbrio.  Ao pintor, é confiado a responsabilidade de saber dosar luz e sombra. Ao poeta, conteúdo e forma. Ao músico, melodia e letra. Bom, ao homem, é confiado a responsabilidade de saber relacionar-se com seus diferentes “Eu” no tempo. Desafios e razões para olharmos para trás sempre existirão, a grande arte é saber daí frequentemente tirarmos conclusões sólidas o bastante para sepultarmos os sofrimentos e dar à luz  novos projetos.

 E quando este dia de perfeito equilíbrio vier, tenho certeza que não será de repente. Aliás, Tenho certeza que não haverá um horizonte nublado nem mesmo a fração de um homem esperando pelo imponderável. Viva o presente ! Pois este dia é hoje .






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